Defesa administrativa é um gênero que abarca diversas modalidades de processos que correm no âmbito não do poder judiciário em sua típica função jurisdicional, mas na relação com a administração pública.
Assim, a defesa administrativa pode acontecer, por exemplo, em um processo administrativo disciplinar (PAD), em que se apura a eventual infração de um servidor público, junto às corregedorias ou comissões de ética dos conselhos profissionais, junto ao fisco, na concessão de benefícios previdenciários junto ao INSS, na impugnação ao tombamento de um imóvel.
É certo que, para cada defesa, haverá um recurso administrativo mais adequado. Uma forma muito corrente é a impugnação a autos de infração, originados do exercício do poder de polícia, ou seja, da fiscalização do poder público.
Estes autos de infração podem ser ambientais, sanitários, trabalhistas, de trânsito, tributários. Cada órgão possui um procedimento próprio de notificação de autuação e a impugnação também pode ser chamada defesa administrativa ou prévia.
Vamos entender melhor sobre a defesa administrativa neste artigo. Leia até o final!
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Qual é a previsão legal da defesa administrativa?
Há legislações específicas sobre determinadas infrações, como o Decreto 70.235/1972, que dispõe sobre o processo administrativo fiscal, o Decreto 6.514/2008, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente e o Código de Trânsito Brasileiro.
Quanto aos exemplos acima, a legislação ambiental trata do processo administrativo para apuração de infrações ambientais no Capítulo II, a partir do artigo 94. A Seção II, que começa no artigo 96, dispõe especificamente sobre a autuação.
O Decreto 6.514/2008 sofreu importantes alterações neste ano de 2022, por meio do Decreto 11.080/2022. Uma delas foi a inclusão do artigo 97-A, que traz justamente a defesa administrativa ao auto de infração ambiental:
Art. 97-A. O autuado poderá, perante o órgão ou a entidade da administração pública federal responsável pela lavratura do auto de infração, no prazo de vinte dias, contado da data da ciência da autuação:
(…)
III – apresentar defesa.
No Código de Trânsito Brasileiro, o tema é abordado no Capítulo XVIII, a partir do artigo 180. A Seção I cuida da autuação e a Seção II, do seu julgamento.
O artigo 281-A, incluído pela Lei nº. 14.071/2020, apresenta o prazo para apresentação de defesa prévia e o início de sua contagem:
Art. 281-A. Na notificação de autuação e no auto de infração, quando valer como notificação de autuação, deverá constar o prazo para apresentação de defesa prévia, que não será inferior a 30 (trinta) dias, contado da data de expedição da notificação.
No processo administrativo fiscal, está disposto no Decreto 70.235/1972:
Art. 14. A impugnação da exigência instaura a fase litigiosa do procedimento.
Art. 15. A impugnação, formalizada por escrito e instruída com os documentos em que se fundamentar, será apresentada ao órgão preparador no prazo de trinta dias, contados da data em que for feita a intimação da exigência.
Como se pode notar, a legislação ambiental concede prazo de 20 (vinte) dias para a defesa administrativa, enquanto que, para o auto de infração no trânsito e autuações de natureza fiscal, esse prazo para impugnação é de 30 (dias).
Em outros casos, é necessário conhecer a legislação local, como os Códigos municipais de Obras, Posturas e Sanitários. De toda forma, a Administração, no exercício do poder regulamentar, organiza os procedimentos em cada repartição.
Porém, basicamente, o procedimento geral é que, a partir da constatação da infração, seja lavrado o auto de infração e expedida a notificação para que o possível infrator apresente sua defesa.
Leia também nosso artigo sobre defesa prévia.
Qual é o procedimento de uma defesa administrativa?
A defesa administrativa ou prévia possui essa nomenclatura porque é apenas após sua análise e julgamento pela Administração que esta poderá aplicar a penalidade.
É possível alegar toda a matéria de fato e de direito em sede de defesa administrativa. Além de ser uma possiblidade excelente de encerramento prematuro do processo administrativo, pois, caso ela não seja acatada, poderá tornar-se uma peça muito importante na fundamentação da impugnação judicial ao auto de infração.
É comum que as próprias repartições públicas já forneçam formulários ou modelos de recurso ou defesa administrativa. Todavia, mesmo neste caso é recomendável que se observe uma estruturação muito semelhante à de uma petição inicial ou impugnação judicial.
Sobre a impugnação jurídica, recomendamos o texto “Impugnação jurídica: estrutura, tipos, formas e quando usar”, aqui do blog da Freelaw.
Dentre os exemplos que citamos neste texto, o processo administrativo fiscal tem a forma da impugnação prevista em detalhes pelo decreto que o estabelece:
Art. 16. A impugnação mencionará:
I – a autoridade julgadora a quem é dirigida;
II – a qualificação do impugnante;
III – os motivos de fato e de direito em que se fundamenta, os pontos de discordância e as razões e provas que possuir;
IV – as diligências, ou perícias que o impugnante pretenda sejam efetuadas, expostos os motivos que as justifiquem, com a formulação dos quesitos referentes aos exames desejados, assim como, no caso de perícia, o nome, o endereço e a qualificação profissional do seu perito.
V – se a matéria impugnada foi submetida à apreciação judicial, devendo ser juntada cópia da petição.
§ 1º Considerar-se-á não formulado o pedido de diligência ou perícia que deixar de atender aos requisitos previstos no inciso IV do art. 16.
Itens obrigatórios em uma defesa administrativa completa
Sendo assim, os recursos administrativos contra autos de infração devem conter, nessa ordem:
- o adequado endereçamento à autoridade administrativa que irá julgá-los;
- a qualificação do autuado e recorrente;
- o nome do recurso (defesa administrativa / prévia / impugnação);
- o número do auto de infração;
- a apresentação dos fatos;
- preliminares, se houver;
- apresentação da fundamentação jurídica;
- apresentação dos pedidos (se houver perícia, o pedido sobre ela deve ser detalhado);
- encerramento com pedido pelo deferimento, data, local, assinatura e OAB.
Exemplos do que pode ser arguido em preliminar
Na preliminar, se for o caso, deve ser apresenta alguma irregularidade na realização da fiscalização que deu causa à lavratura do auto de infração que possa acarretar na sua invalidação, como a prescrição, o erro quanto à pessoa autuada, a inobservância de uma formalidade obrigatória.
São situações em que o próprio auto de infração é anulado ou a autuação àquela pessoa é desconstituída, não sendo necessário sequer chegar à defesa de mérito, sobre o conteúdo da autuação.
Pode-se citar como exemplo o artigo 97 do Decreto 6.514/2208:
Art. 97. O auto de infração deverá ser lavrado em impresso próprio, com a identificação do autuado, a descrição clara e objetiva das infrações administrativas constatadas e a indicação dos respectivos dispositivos legais e regulamentares infringidos, não devendo conter emendas ou rasuras que comprometam sua validade.
Caso esse dispositivo não seja observado em sua integralidade, o auto de infração ambiental é passível de anulação, a ser requerida em preliminar na defesa administrativa.
No Código de Trânsito Brasileiro encontram-se hipóteses que podem ser trabalhadas pelo advogado em preliminar e na argumentação principal da defesa administrativa:
Art. 281. A autoridade de trânsito, na esfera da competência estabelecida neste Código e dentro de sua circunscrição, julgará a consistência do auto de infração e aplicará a penalidade cabível.
Parágrafo único. O auto de infração será arquivado e seu registro julgado insubsistente:
I – se considerado inconsistente ou irregular;
II – se, no prazo máximo de trinta dias, não for expedida a notificação da autuação.
Por sua complexidade um pouco maior, o auto de infração fiscal oferece ainda mais material para ser explorado pelo recurso administrativo:
Art. 10. O auto de infração será lavrado por servidor competente, no local da verificação da falta, e conterá obrigatoriamente:
I – a qualificação do autuado;
II – o local, a data e a hora da lavratura;
III – a descrição do fato;
IV – a disposição legal infringida e a penalidade aplicável;
V – a determinação da exigência e a intimação para cumpri-la ou impugná-la no prazo de trinta dias;
VI – a assinatura do autuante e a indicação de seu cargo ou função e o número de matrícula.
Art. 11. A notificação de lançamento será expedida pelo órgão que administra o tributo e conterá obrigatoriamente:
I – a qualificação do notificado;
II – o valor do crédito tributário e o prazo para recolhimento ou impugnação;
III – a disposição legal infringida, se for o caso;
IV – a assinatura do chefe do órgão expedidor ou de outro servidor autorizado e a indicação de seu cargo ou função e o número de matrícula.
Parágrafo único. Prescinde de assinatura a notificação de lançamento emitida por processo eletrônico.
São mais de dez requisitos obrigatórios a serem observados pelo Fisco sob pena de nulidade do auto de infração! Isso é bom para o advogado, pois lhe dá espaço para trabalhar sua argumentação preliminar e de mérito. Qualquer irregularidade pode ser capaz de anular total ou parcialmente a notificação.
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Conclusão: elaboração de uma boa defesa administrativa
Apesar de, via de regra, o processo administrativo ser bem menos burocrático do que o judicial, isso não significa que a defesa administrativa seja necessariamente simples e de fácil execução.
O advogado deve estar bem preparado, conhecer a legislação específica do caso concreto e as formalidades da repartição pública em que apresentará sua defesa administrativa. É de suma importância sempre ter atenção às diferenças quanto à forma de apresentação da defesa administrativa e o prazo.
O conhecimento da legislação ajudará o advogado também a checar se o auto de infração está de acordo com ela, pois o procedimento e as informações obrigatórios para sua validade são muitas vezes minuciosamente previstas nas leis e decretos. Isso torna o trabalho de construção da defesa mais ágil e objetivo.
A impugnação deve ser a mais abrangente possível, pois a matéria que não for expressamente contestada na defesa administrativa será considerada incontroversa. E, caso não seja acolhida pelo julgador, o autuado inconformado precisará recorrer à via judicial.
Nesse caso, um recurso administrativo bem feito será de grande valia na construção da tese a ser levada ao judiciário, fornecendo elementos de prova para convencimento do magistrado, além de poupar trabalho dobrado ao advogado.
O conhecimento sólido sobre peças processuais também é altamente recomendável, pois sua forma será aproveitada na estruturação da peça administrativa. Caso você ainda não tenha conferido os artigos do blog da Freelaw sobre várias peças processuais, seu cabimento e modelos, não deixe de fazê-lo!
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